Uma releitura ácida e irreverente dos textos sagrados, com mestres dos quadrinhos expondo o lado sombrio do Antigo Testamento.
A Tábula Editora traz para o público brasileiro “Histórias Constrangedoras do Velho Testamento”, uma antologia polêmica e provocadora que transforma passagens bíblicas em contos ilustrados repletos de humor ácido, crítica social e, claro, muita irreverência. Baseado no clássico “Outrageous Tales from the Old Testament” da britânica Knockabout, o livro chega em edição restaurada e traduzida por Dandara Palankof, mantendo a arte icônica da capa original, adaptada por Germana Viana.
Lançado originalmente em 1987, o material nasceu como uma resposta direta à censura imposta à Knockabout pelos rigorosos (e muitas vezes absurdos) tribunais britânicos. Perseguida por distribuir quadrinhos underground, a editora decidiu expor a ironia da situação: enquanto suas publicações eram banidas, a Bíblia, disponível em toda igreja do Reino Unido, continha histórias ainda mais chocantes. A provocação atraiu nomes de peso como Neil Gaiman, Alan Moore, Brian Bolland e Dave McKean, resultando em uma obra que desafia tanto os dogmas religiosos quanto a hipocrisia moral da época.

Entre os destaques, temos Alan Moore e Hunt Emerson reinterpretando as passagens de Levítico 20 com um humor sarcástico e impiedoso. Dave Gibbons entrega uma versão visualmente impecável da destruição de Sodoma e Gomorra, enquanto Kim Deitch leva seu traço perturbador ao drama de Jó. Mas talvez o mais impactante seja o trabalho de Mike Matthews e Steve Gibson, que transformam o Livro dos Juízes em uma grotesca narrativa no estilo dos quadrinhos da EC Comics.
O grande mérito da obra é seu tom satírico, que amplifica as contradições do Antigo Testamento sem perder a essência dos textos originais. É claro que “Histórias Constrangedoras do Velho Testamento” não é uma leitura para os facilmente ofendidos – seu objetivo não é apenas entreter, mas questionar.
Publicada em formato europeu (20×28 cm), com 76 páginas em preto e branco e capa cartonada, a edição brasileira entrega uma experiência visualmente rica e fiel à proposta original. A adaptação para o português preserva o tom irreverente dos diálogos, garantindo que a provocação se mantenha tão afiada quanto no lançamento original.
No fim, como toda antologia, há altos e baixos, mas o saldo é positivo. Para quem aprecia quadrinhos transgressores e narrativas que desafiam convenções, essa é uma leitura imperdível.